I Colóquio Machado de Assis, Literatura & Tradução
O I Colóquio Machado de Assis, Literatura e Tradução correu entre os dias 29 de abril e 08 de maio na Universidade Federal do Ceará, no CH 2. O evento foi organizado pela Pós-graduação em Estudos da Tradução, POET | UFC.
Durante os dias 29 e 30 de abril, no Auditório José Albano, ocorreram conferências, mesas-redondas acerca da obra de Machado de Assis e sua importância na área da Tradução.
Programação
29 de abril de 2015
09:00 – Mesa de Abertura:
- Gil de Aquino Farias (Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação)
- Vládia Maria Cabral Borges (Diretora do Centro de Humanidades),
- Cícero Anastácio Araújo de Miranda (Chefe do Departamento de Letras Estrangeiras),
- Luana Ferreira de Freitas (coordenadora da POET)
Coordenação: Rafael Ferreira da Silva (UFC)
09:30 – Conferência de Abertura: Angela Gutierrez: “A fascinação de Machado por Alencar”.
Coordenação: Fernanda Coutinho (UFC)
Angela Maria Rossas Mota de Gutiérrez é doutora em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais, onde realizou também pós-doutorado, com a pesquisa “O retrato do Conselheiro: as múltiplas faces do beato de Belo Monte”. Como professora da UFC, foi coordenadora-fundadora do Programa de Pós-Graduação em Letras, Diretora-fundadora do Instituto de Cultura e Arte-ICA e Diretora da Casa de José de Alencar. Principais áreas de atuação: Literatura e História; Literatura sobre Canudos; José de Alencar, Machado de Assis, Euclides da Cunha e Mario Vargas Llosa; Cidade de Fortaleza e Cultura e Arte. Entre suas publicações estão O mundo de Flora (romance, 1990, Prêmio Estado do Ceará), Vargas Llosa e o romance possível da América Latina (ensaio, 1996), Canção da menina (poesia, 1997), Avis rara (ficções, 2001); e Luzes de Paris e o fogo de Canudos (romance, 2006); Os Sinos de Encarnação (contos, 2012, Prêmio Osmundo Pontes). Entre outras obras editadas em parceria, organizou, em colaboração com Sânzio de Azevedo, o livro Iracema, lenda do Ceará, 2005, edição bilingue, português-francês, comemorativa dos 140 anos de publicação do romance de Alencar; É membro e Diretora Cultural da Academia Cearense de Letras e sócia efetiva e segunda vice-presidente do Instituto do Ceará (Histórico, Geográfico e Antropológico).
Resumo. Dois homens que vivem na mesma cidade, de diferentes origens e igual vocação para as letras, encontram-se, respeitam-se e se tratam com afeto. O mais jovem, Machado de Assis, deslumbra-se com a figura do já consagrado Alencar: “A sensação que recebi no primeiro encontro pessoal com ele foi extraordinária […], contentando-me de fitá-lo com olhos assombrados do menino Heine ao ver passar Napoleão. A fascinação não diminuiu com o trato do homem e do artista”. A coleta e a análise de referências ao escritor cearense e a suas obras, em textos machadianos de crítica, crônica e correspondência, iluminam essa relação e a cena cultural na corte do Segundo Império.
10:30 – Mesa-redonda 01
- Fernanda Coutinho (UFC): “Graziela, Gatinho preto, Miss Dollar: Machado de Assis e seu zoo particular”,
- Marie-Hélène Catherine Torres (UFSC): “Machado de Assis em francês”,
- Luana Ferreira de Freitas (UFC): “Machado de Assis em inglês”
Coordenação: Yuri Brunello (UFC)
Fernanda Coutinho é professora de Teoria da Literatura e Literatura Comparada do curso de Letras da Universidade Federal do Ceará, onde é membro efetivo do Programa de Pós-Graduação em Letras da e da POET (Pós-graduação em Estudos de Tradução). Doutora em Teoria da Literatura (UFPE, 2004), com tese sobre As imagens da infância em Graciliano Ramos e pós-doutora em Literatura Comparada (UFMG/Université de la Sorbonne, Paris IV, 2010), com pesquisa sobre Animais e crianças em Graciliano Ramos.
Resumo. Entre as características que identificam o profundamente reflexivo escritor Machado de Assis, estão, sem dúvida, o enfado e mesmo a derrisão que dedica aos animais humanos, em função de seu comportamento desarrazoado e até cruel, inclusive com relação a seus companheiros de existência na Terra, os animais não-humanos. Já os últimos recebem muitas vezes de sua parte um olhar de bonomia e afeição, não apenas no âmbito ficcional, mas também do ponto de vista biográfico, aspectos apanhados em flashes de sua vivência doméstica ao lado de Carolina. Este trabalho busca situar Machado de Assis como um pensador da questão animal, tão presente em nossa contemporaneidade, na medida em que sua história de vida e também sua ficção são espaços onde se constroem zoos diversos. O que podemos nós aproveitar ainda hoje dessa construção que remonta, em último caso, ao princípio do século XX? As observações em questão encontram respaldo, entre outros, em FONTENAY (1998, 2008) LESTEL (2007, a, b) e MACIEL (2008, 2011, a, b).
15:00 – Conferência: Amina Di Munno (Università de Genova): “Machado de Assis contista: do cotidiano ao universal”.
Coordenação: Marie-Hélène Catherine Torres (UFSC)
Amina Di Munno é professora de Língua e Literaturas Portuguesa e Brasileira na Università di Genova. Participa do “Collegio Docenti del dottorato in Letterature Comparate Euro-Americane” na mesma Universidade. Realizou traduções, estudos, seminários, cursos de Literatura na Itália e no Brasil sobre autores dos séculos XIX e XX, principalmente Eça de Queirós, Antero de Quental, Machado de Assis, Fernando Pessoa e autores contemporâneos, entre eles Clarice Lispector, Milton Hatoum e o poeta Cássio Junqueira. Foi membro da redação da Revista Queirosiana (Coimbra). Participou da equipe de tradução automática do World Translation Center de La Jolla (San Diego), Estados Unidos, elaborando o manual de tradução do inglês para o português. Foi vencedora de um edital de bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian sobre estudos pessoanos. Recentemente traduziu, do italiano para o português, O silêncio dos violinos, livro de poemas de Roberto Malini (Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2015). É membro da Associação de Lusitanistas Italianos, presidente da Associação “Amici di Casa America” e vice-presidente da Associazione di Brasilianisti Italiani Jacarandá.
Resumo: O objetivo do presente trabalho é mostrar, através da análise de alguns contos de Machado de Assis, especificamente dos mais significativos por mim traduzidos para o italiano, perspectivas de leitura a partir da temática assim como da linguagem do grande autor. Um dos aspectos da genialidade de Machado de Assis, em que mesmo com matizes diferentes concordam muitos estudiosos, consiste na característica peculiar que o situa contemporaneamente no âmbito dos grandes escritores brasileiros, aliás, talvez o maior, e no olimpo dos narradores universais. Machado observa e representa o cotidiano da cidade do Rio de Janeiro do século XIX desde vários pontos de vista e nesse contexto retrata as figuras humanas, principalmente femininas, com seus conflitos internos, seus segredos, suas paixões. Sentimentos universais. Em sua forma de narrar, originalíssima, Machado, recupera, outrossim, a herança da literatura clássica que influencia os procedimentos formais de seu estilo. Não são raros os casos em que ele transcende o circunstancial com o emprego da metáfora, da alegoria e de outras figuras retóricas, além das citações, alusões que o elevam em voos altos em direção de temas e figuras, a partir de Dante, mais uma vez universais.
16:30 – Mesa-redonda 02
- Eduardo Luz (UFC): “Três faces da crítica nacionalista de Machado de Assis”;
- Yuri Brunello (UFC): “Verga, Machado e as ‘malformações nacionais'”;
- Atilio Bergamini: “Um romance entre o jornal e o livro”
Coordenação: Marta de Senna (Casa Rui Barbosa)
Eduardo Luz possui doutorado em Literatura Comparada pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Tem sete livros publicados, nos campos do romance, da crítica e da teoria. Produziu material didático de Língua Portuguesa para o ensino médio. Com seu grupo de música, lançou em 2007 um CD duplo. É professor de Teoria da Literatura na Universidade Federal do Ceará desde 1992.
Resumo. O trabalho visa a analisar três perspectivas nacionalistas oferecidas pela obra crítica de Machado de Assis. No primeiro momento, investigamos a adesão de Machado ao programa romântico de afirmação da nacionalidade, a partir de seu cotejo com Santiago Nunes Ribeiro, Joaquim Norberto de Sousa Silva, Macedo Soares e José de Alencar. Explorando, predominantemente, sua crítica teatral, identificamos o lugar de Machado no ambiente de um nacionalismo duro e xenófobo, em que, para afirmar a si mesmo, era imprescindível a exclusão do outro. No segundo instante, trabalhamos com o viés nacionalista na chave do que chamamos “classicismo moderno” de Machado de Assis. Para tal análise, usamos o corpus de sua crítica literária como gênero autônomo, oferecida convencionalmente ao público. Por fim, como terceiro momento, avaliamos seu nacionalismo com corte na ideia de “pátria cultural”. Após superar o nacionalismo como programa, imposto ideologicamente como dever do emissor, Machado propôs um nacionalismo segregado pelo paradoxo montado na atualização histórica e na autonomia literária imposta pela modernidade; agora, vai ampliar o nacionalismo pelo campo contextual, no qual dialogam a cultura popular e a cultura erudita. Nesse último caso, a investigação se faz por sua crônica, um dos gêneros para os quais Machado reorientou sua crítica formal, depois de abandoná-la. Do ponto de vista arquitextual, a crônica foi preferencialmente a arena em que exercitou sua teoria – assistemática, embora – da cultura brasileira. Nessa pesquisa, à medida que promovia a exploração de uma nação artística e cultural, desenvolveu, paralelamente, uma espécie de busca do caráter nacional brasileiro. Essas três faces devem propiciar uma apreensão mais criteriosa e, por via de consequência, mais produtiva de tópicos nacionalistas acionados pela crítica machadiana, facultando, por sua vez, alguma luz sobre os temas “nacionalismo” e “Machado de Assis”, ainda quando examinados isoladamente.
Atilio Bergamini é professor do departamento de Literatura da UFC. Tem pós-doutorado sobre história da leitura, com ênfase no romance, no IEL/UNICAMP (FAPESP). Tem doutorado em Literatura Brasileira na UFRGS, com estágio sanduíche na Yale University, onde estudou Machado de Assis.
Resumo. As Memórias póstumas de Brás Cubas foram publicadas pela primeira vez entre março e dezembro de 1880 na Revista Brasileira. Na maior parte das vezes, porém, análises consideram esse suporte mero acidente dispensável para a explicação dos dilemas de composição do romance. Tendo em vista colaborar para a resolução dessa lacuna na fortuna crítica desse romance tão estudado, buscaremos compreender quais as possíveis relações entre a forma artística das Memórias e o projeto editorial da revista.
Yuri Brunello é é professor Adjunto de Língua e Literatura Italianas da Universidade Federal do Ceará. Foi professor da Universidade Federal do Paraná e visiting researcher na Concordia University of Montreal. Tem doutorado pela Università “La Sapienza” di Roma e mestrado pela Universidade Federal da Bahia. Pesquisa especialmente a produção e o legado de Luigi Pirandello, a cultura do barroco, a literatura latino-americana e a filosofia de Antonio Gramsci.
Resumo. A apresentação terá como objeto a avaliação do ”verista” italiano Giovanni Verga (Vizzini, Catania; 1840-1922) na perspectiva critica comparatista realizada por Franco Moretti no livro The Bourgeoise: Between History and Literature, traduzido no Brasil como O Burguês. Entre a historia e a literatura. Moretti realiza uma comparação entre Verga e Machado, interessante sobretudo em razão dos pressupostos teóricos de tal aproximação em aparência tão inusitada. Franco Moretti, nos últimos quinze anos, participando da tendência teórica e critica dos estudos acerca da world literature, elaborou a teoria do distant reading, que considera os textos literários enquanto “processos” e não simplesmente – conforme acontece com o close reading – enquanto “produtos”. Moretti, de fato, foca na produção literária considerada como um processo não romanticamente individual, mas objetivo, de natureza evolucionista e que requer, portanto, uma abordagem critico-científica. Analisando o mecanismo de produção-distribuição-consumo do objeto romance, Moretti compara Verga e Machado, atribuindo aos dois escritores a capacidade de participar de maneira parecida da articulação econômica, política e cultural, a nível global, entre o centro e periferia.
30 de abril de 2015
09:00 – Conferência:
Cid Ottoni Bylaardt (UFC): “O belo e terrível mundo de Brás Cubas e a impossibilidade da morte”;
Coordenação: Robert de Brose (UFC)
Cid Ottoni Bylaardt possui graduação em Letras (1976) e doutorado em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais (2006), e pós-doutorado em Literatura Comparada pela Universidade de Coimbra, Portugal. É professor Associado I de Literatura Brasileira da Universidade Federal do Ceará, com projeto de pesquisa denominado “Esvaziamento da História nas Literaturas Brasileira e Portuguesa Contemporâneas”. Tem mais de uma centena de textos publicados sobre literatura e cultura brasileira e portuguesa, e orienta teses e dissertações. Escreve também poemas e romances. É músico amador (instrumentos: piano e violino), com interesse em música brasileira e internacional (clássica e erudita). É bolsista do CNPq.
Resumo. Brás Cubas, o famigerado defunto escritor de Machado de Assis, enuncia a prosa de quem não pode mais contar, encenando a impossibilidade de dizer, a qual, no pensamento de Maurice Blanchot, corresponde à impossibilidade da morte. A literatura, assim, situa-se do outro lado da morte e da compreensão; ela pertence ao domínio onde “a conclusão se torna o desaparecimento de qualquer conclusão”, nas palavras de Blanchot. Este texto, ao estabelecer um diálogo entre o romance Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado, e o ensaio “A literatura e o direito à morte”, de Blanchot, pretende mostrar como se realiza essa impossibilidade, e como ela se torna o próprio da literatura.
10:30 – Mesa-redonda 03
- Marcelo Brice (UFT): “A competição das leituras machadianas”;
- Fabio Lima (Fundação Biblioteca Nacional): “Machado de Assis traduzido: um balanço do Programa de Apoio à Tradução da Fundação Biblioteca Nacional”
Coordenação: Orlando Luiz de Araújo (UFC)
Marcelo Brice possui graduação em Ciências Sociais pela UFG (Universidade Federal de Goiás) e mestrado em Sociologia pela mesma universidade. É doutorando em Sociologia na UFG e professor do curso de Ciências Sociais na UFT (Universidade Federal do Tocantins) desde outubro de 2011. Pesquisa sociologia, com ênfase em teoria sociológica, sociologia da cultura e sociologia da literatura, atuando principalmente nos seguintes temas: arte e sociedade, estética, literatura, discurso, pensamento social no Brasil e poder.
Resumo. Há uma disputa histórica pela apropriação de Machado de Assis e sua obra nas diversas leituras críticas. Uma dessas querelas se dá em torno da noção de localismo e universalismo. O autor é abrangente não porque para ele valha qualquer abordagem, mas pelos desdobramentos sempre profícuos que podem florescer a partir e através dele. Machado de Assis é um autor dessa ordem exatamente porque quanto mais se fustiga, mais novas possibilidades aparecem e outras podem ser reavaliadas. Por muito tempo foi considerado um autor ausente das coisas de seu país, depois se redescobriu os traços locais que o permeavam. Agora, em um momento de novas reconsiderações, a disputa é por sua amplitude como literato. Preocupado em fazer literatura distinta e significativa, Machado de Assis também esteve ligado ao substrato que lhe motivava, e notadamente atento ao seu legado. Propomos colocar em perspectiva a sua forma pelos pontos de vistas conflitivos de Roberto Schwarz, em “Leituras em competição”, e Abel Barros Baptista, em “Ideia de Literatura Brasileira com propósito cosmopolita”.
Fabio Lima é coordenador do Programa de Apoio à Tradução e à Publicação de Autores Brasileiros no Exterior da Fundação Biblioteca Nacional.
15:00 – Mesa-redonda 04
- Berthold Zilly: “Do Memorial de Aires ao Tagebuch des Abschieds [Diário da despedida]”;
- Mayara Ribeiro Guimarães (UFPA): “Habitar a língua do outro é acolher a palavra do estrangeiro: a tradução de Memorial de Aires para o alemão”;
- José Leite de Oliveira Junior (UFC): “Machado de Assis em esperanto”;
- Walter Carlos Costa (UFSC/UFC): “O projeto Machado holandês de August Willemsen”
Coordenação: Marcelo Brice (UFT)
Berthold Zilly tem doutorado sobre o teatro de Molière. 1974-2010. Foi professor de literatura latino-americana e de língua portuguesa na FU Berlin, 2004-2010, também na Universidade de Bremen, sempre com enfoque especial na cultura brasileira. Atualmente, é professor visitante na PGET (Pós-Graduação em Estudos da Tradução, da UFSC), em Florianópolis. Traduziu clássicos hispano-americanos e brasileiros para o alemão, entre eles, Os Sertões de Euclides da Cunha, Triste fim de Policarpo Quaresma de Lima Barreto, Memorial de Aires de Machado de Assis, Civilización y barbarie de Domingo Faustino Sarmiento. Pratica a tradução como parte integrante do ensino e da pesquisa de línguas e literaturas estrangeiras e dos estudos interculturais. Prêmios: Wieland-Übersetzerpreis (Prêmio de Tradução Wieland, Alemanha); Prêmio da APCA Associação Paulista de Críticos de Artes), pela divulgação da literatura brasileira no estrangeiro; Ordem do “Cruzeiro do Sul” (Brasil); Prêmio Martius-Staden, de cooperação Brasil-Alemanha (Brasil).
Resumo. Pretende-se examinar alguns problemas centrais da metamorfose para o alemão do último romance de Machado. Um deles é o próprio título, intraduzível diretamente, de modo que foi preciso procurar outra solução, no caso: Tagebuch des Abschieds [Diário da despedida], que alude à trama e também à forma narrativa, serial, subjetiva. Se, por um lado, isso constitui uma desambiguização, com relação ao original, por outro lado, vai ao encontro do narrador que, de propósito, confunde os acontecimentos com o seu registro na escrita, o tempo decorrido com o espaço que vai ocupando no papel. Aqui, como em outros aspectos, é útil combinar a microanálise e a macroanálise, o olhar para detalhes filológicos e uma visão de conjunto do texto. É elucidativa a discussão sobre palavras-chave, polissêmicas, isotópicas e estruturadoras, como “graça”, “gosto”, “discrição”, “interesse”, “saudade”. Uma língua-alvo pode ajudar a discernir mais claramente estruturas profundas do texto-fonte, o que acontece, por exemplo, com a dubiedade de quase tudo o que o narrador relata no discurso indireto, já que, para este, o alemão tem três modos: o indicativo, o subjuntivo I, e o subjuntivo II. Outro problema são os pressupostos geográficos, históricos e culturais do texto, por exemplo, a transição Império-República e escravidão-abolição, ou as numerosas alusões literárias. Cabem, por fim, reflexões sobre a posição e recepção do romance na literatura brasileira, e da sua versão alemã na cultura de chegada.
Mayara Ribeiro Guimarães, bacharel em Letras Português/Inglês pela UFRJ, mestre e doutora em Literatura Brasileira pela UFRJ, com pós-doutorado em Literatura Comparada pela UFRJ. É professora adjunta de Literatura Brasileira na Universidade Federal do Pará, atuante na área de Estudos Literários, com ênfase em prosa e poesia dos séculos XX e XXI, Teoria Literária e Tradução. Coordena o grupo de pesquisa vinculado ao CNPq intitulado Estudos de Literatura, Tradução e Imagem. Desenvolve os projetos “A encenação do heterogêneo na literatura contemporânea em língua portuguesa” e “Tradução como encenação: literatura em língua inglesa traduzida por poetas e ficcionistas brasileiros”. É organizadora do livro de ensaios No meio-dia verde do agora. Formas do contemporâneo na literatura brasileira, e coorganizadora, com Luis Maffei, de Clarice Lispector – Extratextos, e com Walter Carlos Costa e Izabela Leal, de No horizonte do provisório: Ensaios sobre tradução.
Resumo. Paul Ricoeur, em Sobre a tradução, reflete sobre as dificuldades do ato de traduzir a partir do termo “prova”, que o filósofo francês retira da leitura de A prova do estrangeiro, de Antoine Berman. Colocar-se à prova da pulsão de traduzir é uma das maneiras de render-se a essa atividade e o trabalho de tradução literária, na esteira de teóricos como Walter Benjamin, implica uma salvação e uma perda. Salvação de quê? Perda de quê? Para responder a essa reflexão, Ricoeur recorre à ideia de que no exercício tradutório, dois parceiros se juntam: o estrangeiro, pela via da obra, do autor e da língua do original, e o leitor, cabendo ao tradutor a atuação como mediador desse encontro. No rastro da reflexão proposta por Ricoeur e entendendo que o horizonte da tradução seria a manutenção de uma dialogicidade do ato de traduzir, quero pensar, nesta comunicação, algumas das estratégias tradutórias, com suas perdas, ganhos e desvios, que a tradução de Memorial de Aires para o alemão (Tagebuch des Abschieds, Tradução de Berthold Zilly, 2008), enfrenta neste exercício onde “habitar a língua do outro é acolher a palavra do estrangeiro”.
José Leite de Oliveira Juniorpossui Licenciatura em Letras pela UECE (Universidade Estadual do Ceará, 1983), mestrado em Letras pela UFC (Universidade Federal do Ceará, 1992) e doutorado pela Universidade Federal da Paraíba. Foi docente da UECE(1986-1996) e da Universidade de Fortaleza (2000-2006). É docente do Departamento de Literatura da UFC desde 2006. Áreas de atuação: Literatura Portuguesa, Literatura Comparada, Ensino da Literatura, Semiótica, Literatura e Pintura, Interlinguística. Participa do Semioce, coordenando o subgrupo Literatura e Visualidade. Administra páginas eletrônicas acadêmicas, como a Entrelaces e a Revista dos Encontros Literários Moreira Campos, ambas do Departamento de Literatura da UFC. É professor, autor, articulista (Monato, Bélgica; Scienca Revuo, Alemanha) e tradutor do esperanto. De 2006 a 2014 coordenou o Curso de Esperanto da UFC, tendo traduzido para o esperanto poemas de Camões, Fernando Pessoa, Manuel Bandeira, como também os contos eróticos e a produção técnico-literária de Ricardo Kelmer (Manlibro de la sendependa verkisto, lançado em 1912, pela Impeto, de Moscou).
Resumo. Desde a proposta da Língua Internacional, em 1887, que passaria a receber o nome de Esperanto (esperançoso), pseudônimo do poliglota e médico judeu polonês Lazaro Ludoviko Zamenhof, a literatura nessa língua planejada passou a ser dividida em original, ou seja, concebida em esperanto, e traduzida, ou seja, traduzida para o esperanto. O próprio Zamenhof tanto foi autor de obras em esperanto, a exemplo do poema La espero, que se tornaria o hino internacional dos esperantistas, com traduzidas, como La batalo de l’ vivo, de Charles Dickens (1891), Hamleto, de William Shakespeare, em 1894, La revizoro, comédia de Gogol, traduzida em 1907, La rabistoj, de Friedrich Schiller (traduzida em 1907), Ifigenio en Taŭrido, de Johann Wolfgang von Goethe (traduzida em 1907), dentre outras obras, incluindo o Velho testamento, concluído em 1917. No Brasil, a comunidade esperantista tanto produziu obras originais como reconheceu a importância de levar a um público internacional nossa literatura. Exemplo notável, no âmbito da tradução, é Leopoldo H. Knoedt, tradutor de Os lusíadas, de Camões, e de Vidas secas, de Graciliano Ramos. O teatro de Machado de Assis seria traduzido em esperanto no cinquentenário de sua morte (1958), por inciativa da Liga Brasileira de Esperanto, e outras obras, sobretudo devidas ao empenho de Paulo Sérgio Viana, como La Divenistino kaj aliaj rakontoj, (2005). Postmortaj rememoroj de Brás Cubas (2006), Dom Casmurro (2007). As traduções procuram não só manter o conteúdo, mas também resguardar a forma e o estilo de Machado de Assis.
17:00 – Conferência de encerramento
- Marta de Senna (Casa Rui Barbosa): “Machado de Assis no século XXI: indexação e hipertexto”
Coordenação: Ana Maria César Pompeu (UFC)
Marta de Senna é pesquisadora da Fundação Casa de Rui Barbosa e bolsista do CNPq. Doutora pelo King’s College da Universidade de Londres e com pós-doutorado na Universidade de Oxford, nos últimos vinte anos vem-se dedicando à obra de Machado de Assis, sobre a qual publicou dois livros (O olhar oblíquo do Bruxo e Alusão e zombaria, ambos em 2ª edição) e organizou dois outros (Machado de Assis – cinco contos comentados e, com Hélio de Seixas Guimarães, Machado de Assis e o outro – diálogos possíveis). É responsável pelo portal www.machadodeassis.net, que abriga um banco de dados sobre citações e alusões na ficção machadiana, uma revista eletrônica, Machado de Assis em linha (Qualis A-1), especializada na obra do autor (da qual é editora sênior) e os romances e contos do autor como hipertexto.
Resumo. A distância entre a publicação da ficção de Machado de Assis, que se deu entre 1858 e 1908, e o leitor do século XXI é praticamente intransponível, a não ser para o leitor culto. Este é capaz de identificar sem ajuda citações e alusões e domina os instrumentos necessários para decifrar o sentido de palavras e expressões hoje em desuso. Mas o leitor comum, ainda que interessado, se depara com obstáculos textuais que acabam por afastá-lo da prosa do nosso autor maior. Nesta conferência, pretendo comentar o trabalho de indexação e de edição da obra ficcional do autor como hipertexto, ao qual me venho dedicando nos últimos dez anos. Serão feitos comentários tanto sobre os romances quanto sobre os contos de Machado de Assis, incluindo os que o escritor publicou apenas nos jornais e revistas de seu tempo, onde permaneceram esquecidos até serem resgatados de modo sistemático no início do século XX.
Encerramento do evento: Ana Maria César Pompeu (UFC, vice-coordenadora da POET)
Ficha Técnica
Comissão Organizadora
Luana Ferreira de Freitas
Nathan Matos Magallhães
Orlando Luiz de Araújo
Walter Carlos Costa
Yuri Brunello
Comitê Científico
Andréia Guerini (UFSC)
Beth Ramos (UFBA)
Camilo Rubén Fernández Cozman Doutorado (Universidad Nacional Mayor de San Marcos)
Maria Aparecida Ferreira de Andrade Salgueiro (UERJ)
Marc Charron (University of Ottawa/Université d´Ottawa)
Rosalia Garcia (UFRGS)
Monitores
Alex Costa
Camargo Lima Barroso
Camila Araújo da Silva
Daniel Jorge Alves de Alcantara
Fernando Cavalcante Lima Filho
José Roberto Fraga Barros
APOIO
CAPES